Crítica: A Garota na Névoa


A investigação de um crime é iniciada no silêncio da ausência das respostas. A vítima parece desviar do caminho que tomava todo dia, o perigo desconhecido irrompe do inesperado. Com essa tensão, A Garota na Névoa cria uma teia de suposições sobre o sumiço de Anna Lou, uma menina de 15 anos de família religiosa, e as suspeitas caem por entre a quieta e aparentemente pacífica cidade italiana.

As montanhas dessa aldeia alpina, situada no norte da Itália, parecem criar uma redoma onde todo o filme se desenrola por meio de uma maquete. Como um mundo em miniatura, a cidade é simples, cada ponto situado onde deveria estar, e esse fato estranho que interrompe a ordem. Como em um globo de neve, a garota do título se move entre a dúvida se está viva ou morta, se por entre essa redoma há imperfeições que conduzem ao mal e à morte.

É o célebre detetive Vogel (Toni Servillo) quem é chamado para investigar o desaparecimento. Ele alia-se à demanda midiática por pautas e polêmicas e logo o espetáculo sobre a morte é montado. O filme tem a sagacidade de apresentar a banalidade do mal entre as instituições, e a pouca segurança existente em um mundo onde a busca pela verdade é cheia de empecilhos morais.

Esta é uma adaptação de um best-seller homônimo, e é o autor, Donato Carrisi, quem dirige a película. A atmosfera é bem construída, de modo que consegue sustentar as reviravoltas de enredo e entrega uma solução consistente. O enredo aplica os estereótipos das cidades pequenas, do detetive estrangeiro, o sumiço de uma garota, para aqui e ali assinalar questões filosóficas como a banalidade do mal e a ética no mundo contemporâneo. E ainda, de forma sutil, possui instantes metalinguísticos em que se fala na construção literária das reviravoltas em uma ficção.

 

Os dois pilares do enredo consistem na dúvida sobre o caráter do detetive Vogel e o professor Loris (Alessio Boni). Trata-se sobre os limites aos quais alguém chegaria por fama, pelo sustento da imagem e do espetáculo, enquanto a morte de mais uma vítima é somada às diversas mortes que ocorrem diariamente de garotas pelo mundo.

O final consegue aumentar o grau de suspense, chegando a arrepiar o espectador diante da frieza dos fatos. Por entre uma cena e outra, o roteiro poderia ter contemplado mais a complexidade e o passado de seus personagens, para tornar a busca pelo suspeito um pouco mais sucinta e criar mais dúvidas sobre os moradores da cidade.

Ainda assim, “A Garota na Névoa” é um bom filme sobre o ego e a destruição, a impotência diante do crime. Reforça as diversas histórias sobre homens que massacram garotas por motivos que nunca serão inteiramente compreendidos, deixando, ao fim, o espanto e a melancolia em face a um mundo envolto pela mais fria crueldade, que nos engolfa tal qual uma névoa cortante.

por Marina Franconeti – especial para CFNotícias