Crítica: Questões de Família


Uma mãe resolve reunir suas três filhas para um comunicado importante, cada uma delas está em momentos muito distintos da vida e precisam redescobrir a forma de viverem as próprias vidas a partir dessa reunião familiar inesperada. Essa é a trama central do longa holandês “Questões de Família” (April, May and June),  um filme de Will Koopman.

April (Linda de Mol) é uma atriz que está com a carreira congelada – enquanto decidem o futuro de sua personagem em uma série, descobriu que seu marido estava a traindo com uma mulher muito mais jovem. Enquanto isso, May (Tjitske Reidinga) é uma mãe super protetora que abandonou a carreira e vive em função da criação dos filhos e de suprir as necessidades individuais de cada um deles. June (Elise Schaap), por sua vez, ainda mora com a mãe, não tem um emprego fixo e tem – ou tinha – um caso com um homem casado. Sim, a mãe as nomeou de acordo com o mês de nascimento.

Além das três elas, há o irmão John (Bas Hoeflaak), que é autista e possui uma fixação por peixes. A mãe é a única que o entende e consegue lidar com suas especificidades, os dois possuem uma ligação intensa.

O drama familiar tem início com a mãe comunicando as filhas que está com um câncer severo e que optou por não se tratar, uma vez que o tratamento lhe daria apenas o acréscimo de alguns meses e a sua qualidade de vida decairia drasticamente.

A Holanda é um dos poucos países no mundo em que a eutanásia ou o “suicídio assistido” é regulamentado. O procedimento é realizado com apoio médico, então essa foi a decisão da matriarca: ela escolhera a data, mas uma questão ainda estava em aberto e ela não partiria antes de saber quem cuidaria de John, qual de suas filhas estava apta a tarefa.

O longa possui muitos personagens e cada um com sua própria faceta, é fascinante observar o apego aos detalhes por parte da diretora, é feito o desenvolvimento de cada indivíduo e apresentada sua própria narrativa. Há o crescimento, por menor que seja a relevância do personagem, para o desenvolvimento da trama central.

Um ponto positivo é que o filme nos apresenta uma mulher à frente de seu tempo, que criou os filhos para o mundo. Há, implicitamente, uma mensagem de que a vida deve ser vivida sem se importar com convenções sociais – isso se reforça em diálogos simples e frações do drama, como o fato de todos os filhos serem de pais distintos, May ter adotado uma garotinha chinesa, April subornar a sobrinha em troca de “disciplina”, o reforço dessa filosofia de vida é feito a todo modo.

Por mais que culturalmente falando não estejamos acostumados ao “suicídio assistido”, ele também dá à produção um sentido especial, pois ver a personagem organizando suas lembranças, reencontrando-se com o passado e preparando seus filhos para sua partida é reconfortante, é uma forma diferente de olhar para a morte. E no fim, essa é a única certeza que temos.

A obra tem esse apelo ao feminino, as auto cobranças impostas a nós mesmas: ser a mãe ideal, ter o “corpo perfeito” mesmo após os 40 anos, encontrar um par. Há homens no filme, mas a relação das protagonistas com eles é secundária, a verdade é que a caminhada das irmãs é solitária para dentro de si.

“Questões de Família” tem drama, amor, diversidade, comédia, entretém e faz refletir sobre relações, família e nossa relação com a própria existência. Disponível na plataforma Cinema Virtual. Confira, há grandes chances você também se encantar.

por Carla Mendes – especial para CFNotícias

*Título assistido via streaming, a convite da A2 Filmes.